domingo, 31 de janeiro de 2010

"Não serei candidato em nome de nenhum partido. Serei candidato por Portugal "



Glória aos vencidos, costumava dizer o velho republicano Mem Verdial no final das romagens do 31 de Janeiro que se faziam no Porto durante a ditadura. Glória aos vencidos é o que me apetece dizer neste dia em que se iniciam as comemorações do Centenário da República. Glória aos vencidos, porque foi o carácter heróico e mítico dessa revolução derrotada que verdadeiramente constituiu o momento inspirador e fundador da revolução que haveria de vencer 20 anos depois.

Foi no Porto, nesse dia, que pela primeira vez, pelas mãos de Alves da Veiga, foi hasteada a bandeira verde rubra. Foi aqui que pela primeira vez, com o sangue vertido pelos revolucionários do 31 de Janeiro, a causa da República se confundiu com a própria causa nacional.

Com efeito, o sobressalto patriótico, provocado pela humilhação do Ultimato inglês de 1890, tinha-se pouco a pouco transformado numa questão de regime. Hoje, quem diz Pátria diz República – escreveu então Guerra Junqueiro. E o que me apetece, neste momento, é repetir com Guerra Junqueiro: Hoje, quem diz Pátria diz República.
Essa é a melhor homenagem que se pode prestar ao 31 de Janeiro e ao Centenário da República. Dizer Pátria como quem diz República. E dizer como Junqueiro o disse: Não uma República doutrinária, estupidamente jacobina, mas uma República larga, franca, nacional, onde caibam todos.

Uma república moderna, tal como está inscrita na nossa Constituição. Com liberdades e garantias individuais, mas com direitos sociais inseparáveis dos direitos políticos. Uma república que rime com Escola Pública, SNS, protecção social, direitos ambientais e culturais. Uma república que seja sinónimo de democracia política, democracia económica e democracia social.

E sobretudo uma república em que as novas gerações possam ter no seu país um lugar ao sol e uma vida vivida sem ser em constante precariedade. Uma república onde a Justiça funcione e onde a igualdade de oportunidades não seja uma retórica vazia.
Convém não esquecer o formidável alerta de Antero de Quental no discurso que pronunciou no Ateneu do Porto como Presidente da Liga Patriótica do Norte. Opondo-se à histeria patrioteira, ele afirmou:”O nosso maior inimigo não é o inglês, somos nós mesmos. Declamar contra a Inglaterra é fácil, emendar os defeitos da vida nacional é mais difícil”.

Era verdade em 1890. Continua a ser verdade agora. E por isso, tal como Antero então propunha, continua a ser indispensável a nossa mobilização cívica e a nossa participação democrática na reforma moral e nas mudanças de que o país precisa.
A minha geração tinha uma prioridade: acabar com a ditadura e com a guerra, viver em paz e em liberdade. Não foi fácil. Foram muitos os que morreram e ficaram física ou moralmente afectados nas guerras de África. Muitos os que passaram pelas cadeias, sofreram torturas ou foram obrigados ao exílio. Mas havia uma esperança, havia a convicção de que se podia construir uma vida melhor e um país diferente.

Hoje, para as novas gerações, a prioridade é o emprego, a realização profissional, a possibilidade de viver, com alguma segurança, no seu próprio país. Parece simples. Mas as novas gerações começam a perder a esperança no seu futuro e a descrer de Portugal. Ora isso é intolerável. A culpa, se culpa há, é dos nossos defeitos, dos nossos descuidos, dos nossos erros, das insuficiências da nossa democracia. É duro reconhecer. Mas tem de ser reconhecido e tem de ser dito.

Se alguma dúvida tinha em relação a uma eventual recandidatura, o que acima de tudo me decidiu foi a obrigação de lutar com todas as forças para que as novas gerações recuperem a confiança em si mesmas, no seu futuro e no seu país. Só assim terá sentido dizer, como disse Junqueiro: Quem diz Pátria diz República.

O caminho – também para equilibrar as nossas contas – passa antes de mais pela resposta a estas perguntas:

-Como potenciar e recompensar o mérito, o talento, o empreendedorismo, o trabalho sério e honesto?

- Como fazer com que os nossos jovens voltem a acreditar em Portugal e na política?

- Como conseguir que as pessoas voltem a acreditar nas instituições que são pilares do Estado de Direito democrático, como a Justiça e a actividade político-partidária?

Não há nenhuma resposta fácil.

Porém, para qualquer solução eficaz, há ingredientes essenciais: integridade, decência, independência e coragem.

Vivemos uma grave crise nacional agravada por uma crise mundial sem paralelo. O Presidente da República tem alertado para os riscos do endividamento do Estado, tem criticado os investimentos públicos programados pelo Governo e tem apontado até o risco de uma situação explosiva. Mas há algo que não tem sido dito e é tempo de dizer.

O endividamento não é só do Estado nem só da esfera pública. É também da Banca, das empresas e das famílias que foram aliciadas e induzidas, por formas muitas vezes agressivas, a recorrerem ao crédito e a consumirem. A solução para o endividamento exige mudanças comportamentais de todos e não apenas do Estado.

Dito isto, é óbvio que, numa primeira fase, é preciso conter o crescimento da dívida e, numa segunda, diminui-lo. Tal não significa cortar o investimento público, nem abdicar do papel do Estado no estímulo ao crescimento económico e no combate ao desemprego. Mas não chega. Se a atracção e a promoção da sociedade de consumo persistirem, o problema de fundo permanece. É por isso que o endividamento não é uma mera questão financeira resolúvel por soluções tecnocráticas, é sobretudo uma questão cultural e cívica.

As empresas de rating, que perderam toda a credibilidade depois da crise de 2007,estão a fazer pressões inadmissíveis sobre o Orçamento português, contra as quais já reagiu, e bem, o Ministro das Finanças. Deixam de parte os países do centro e norte da Europa, cuja situação não é muito melhor do que a nossa e procuram equiparar-nos à Grécia. E voltam a falar dos PIGS (Portugal, Itália, Grécia, Spain). Trata-se de um nova forma de racismo, o racismo económico. E tem um desagradável sabor a ultimatum.


O Orçamento do Estado é elaborado e decidido pelos órgãos competentes eleitos pelo povo português e não por empresas privadas ao serviço de estratégias comerciais alheias.

Numa fase de grande pressão internacional sobre o nosso país, compreende-se que o Estado tenha que dar algum sinal de que pretende resolver este problema. Mas o importante é que o povo português sinta que o esforço para sair da crise não recai apenas sobre os mais desfavorecidos, os desempregados, os reformados, os trabalhadores precários, as PME, as novas gerações, ou seja, os mesmos de sempre.
Instalou-se a percepção de que não vale a pena sonhar, não vale a pena ter mérito, não vale a pena ter talento, não vale a pena ser sério e trabalhador, porque nada disso importa, nada disso é recompensado. Ora isto é terrível. Este é o drama do nosso tempo e da nossa juventude.

Esta é a raiz do problema, mais do que os desequilíbrios do défice e das contas externas. Há também um défice social, um défice de sonho e de esperança no futuro.

A 15 de Janeiro anunciei em Portimão a minha disponibilidade para me candidatar de novo à Presidência da República. Tal como há 4 anos, fi-lo a título pessoal. Os resultados então obtidos mostraram que a vida democrática não se esgota nos aparelhos políticos. Este encontro, como outros que antes se realizaram e outros que vão ter lugar, comprova, aliás, que a mobilização cívica que então nasceu ainda não parou nem vai parar. Não que eu deseje a repetição do que então se passou. A crise que o país atravessa e a importância da próxima eleição presidencial, exigem um grande sentido da responsabilidade, a maior abrangência possível e a mobilização de todos os portugueses que não se reconheçam numa visão tecnocrática da política, que tende a esquecer que uma nação é mais que números e economia.

O cargo de Presidente da República é unipessoal e independente. A decisão dos eleitores não é determinada pela posição ideológica do candidato, mas pela sua personalidade e pelos valores que defende. Foi nessa perspectiva que anunciei a minha disponibilidade.

Rejeito os rótulos e as simplificações perversas. Sou um homem livre, e tenho a honra de estar rodeado por cidadãos livres e empenhados.

Não serei candidato em nome de nenhum partido. Serei candidato por Portugal e pela necessidade de dar uma nova esperança à democracia portuguesa.

Não há democracia representativa sem os partidos, mas os partidos não podem monopolizar a democracia.

Não renego o meu percurso, as minhas convicções e a minha afectividade partidária.
Sempre estive na linha da frente dos combates mais duros do PS: pela democracia, pela liberdade, pela integração europeia, e pelos direitos sociais.

Tenho orgulho nesses combates que travei pelo PS.

E não posso deixar de achar irónico que alguns, que estavam do outro lado da barricada nas horas mais difíceis, que durante décadas combateram o PS e as suas causas, venham hoje, por puro oportunismo e com o zelo de recém-convertidos, fazer a defesa dos supostos interesses do PS, ao mesmo tempo que parecem esquecer quem é o verdadeiro adversário.

E eu pergunto: de que lado estiveram essas pessoas quando era arriscado ser militante socialista? Que vitórias deram ao PS?

E de facto foram muitas e muito importantes, essas vitórias do PS. Penso desde logo na consolidação da democracia, na integração europeia, no serviço nacional de saúde e outros direitos sociais.

Penso, em especial, nos direitos das mulheres: na sua emancipação jurídica, social e económica. Penso no acesso a carreiras (como a magistratura e a diplomacia) que antes lhes estavam vedadas. Penso na primeira Lei do Divórcio conseguida por Salgado Zenha e em outras leis que deram corpo ao princípio da igualdade de género, que antes do 25 de Abril não existia.

Aquilo a que assistimos em Portugal, desde a instauração da democracia, foi também a uma revolução no plano dos costumes e das liberdades. Ora seria bom que na Presidência da República houvesse uma visão mais aberta e defensora das liberdades, da igualdade e do respeito pelas minorias. A tolerância passa desde logo por não querer impor, em leis gerais da República, dogmas ou juízos de censura moral e religiosa. É necessário respeitar a diferença e promover a igualdade. Essa é a tradição portuguesa de que nos devemos orgulhar: abertura ao mundo, aos outros e ao que é diferente, sem ceder ao preconceito e ao conservadorismo estéril.

Não me apresento como um salvador da Pátria. Portugal, aliás, já devia ter aprendido a lição dos homens providenciais que não salvam o país e tudo reduzem à sua pessoa. Essa é uma abordagem que menoriza o valor da cidadania e das capacidades dos portugueses.

Não vos engano com promessas que não posso cumprir. Não faço uma leitura dos poderes presidenciais que é equívoca e geradora de tensões institucionais e políticas. É desejável, especialmente em períodos de crise, que o Presidente exerça uma magistratura de influência e promova uma cultura de responsabilidade, mas não no sentido de patrocinar alianças nem de interferir no consenso ou dissenso que tem o seu lugar próprio: a Assembleia da República.

Não serei um Presidente corta-fitas, mas entendo que o equilíbrio de poderes estabelecido pela nossa Constituição é claro. E eu defenderei a nossa Constituição.
O Presidente é eleito por sufrágio directo e universal. Tem uma ligação única e íntima com o povo. Tem o poder de dissolução e sobretudo dispõe do poder da palavra e do exemplo. Estes poderes são suficientes para o exercício de uma magistratura de influência, em nome da estabilidade, transversalidade e união de todas as portuguesas e portugueses.

Não me candidatarei para governar, nem terei como objectivo principal e imediato criar as condições para demitir o actual governo na primeira oportunidade. É bom que isso fique claro nos espíritos de quem ainda não percebeu o que está em causa.
Nos próximos meses, as opções ganharão contornos mais precisos. Veremos qual será o candidato que mais garantias oferecerá, na defesa da estabilidade, da exigência, mas também da tolerância, da cultura e da sensibilidade social.

A minha decisão é pessoal. E marca desde já o propósito de independência que é inerente ao cargo de Presidente da República.

Não obriga nem pressiona ninguém. Mas também não se deixa condicionar por aqueles que, mais do que em vencer a próxima eleição presidencial, parecem sobretudo empenhados em impedir a minha candidatura, sem apresentar uma alternativa credível.
Não me deixo intimidar, nem instrumentalizar. Não sou apropriável por estratégias alheias. Mas também não sou refém de negócios, nem de interesses, nem de qualquer outro objectivo que não seja o de servir o meu país. Sou um homem de convicções que sempre deu a cara por elas e que, por elas, convosco, com muitos mais, com portuguesas e portugueses de todos os quadrantes, está de novo disposto a bater-se pela República e por Portugal.

Manuel Alegre
31 de Janeiro de 2010

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O CAVALEIRO

Talvez o espere ainda a Incomeçada
aquela que louvámos uma noite
quando o abril rompeu em nossas veias.
Talvez o espere a avó o pai amigos
e a mãe que disfarça às vezes uma lágrima.
Talvez o próprio povo o espere ainda
quando subitamente fica melancólico
propenso a acreditar em coisas misteriosas.

Algures dentro de nós ele cavalga
algures dentro de nós
entre mortos e mortos.
É talvez um impulso quando chega maio
ou as primeiras aves partem em setembro.

Cargas e cargas de cavalaria.
E cercos. Conquistas. Naufrágios naufrágios.
Quem sabe porquê. Quem sabe porquê.
Entre mortos e mortos
algures dentro de nós.

Quem pode retê-lo?
Quem sabe a causa que sem cessar peleja?
E cavalga cavalga.

Sei apenas que às vezes estremecemos:
é quando irrompe de repente à flor do ser
e nos deixa nas mãos
uma espada e uma rosa.

Manuel Alegre
Atlântico

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terça-feira, 26 de janeiro de 2010

EDIÇÃO DE AMANHÃ DO ALTO ALENTEJO


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A VOZ QUE NOS RASGOU POR DENTRO

De onde vem - a voz que
nos rasgou por dentro, que
trouxe consigo a chuva negra
do outono, que fugiu por
entre névoas e campos
devorados pela erva?

Esteve aqui — aqui dentro
de nós, como se sempre aqui
tivesse estado; e não a
ouvimos, como se não nos
falasse desde sempre,
aqui, dentro de nós.

E agora que a queremos ouvir,
como se a tivéssemos re-
conhecido outrora, onde está? A voz
que dança de noite, no inverno,
sem luz nem eco, enquanto
segura pela mão o fio
obscuro do horizonte.

Diz: "Não chores o que te espera,
nem desças já pela margem
do rio derradeiro. Respira,
numa breve inspiração, o cheiro
da resina, nos bosques, e
o sopro húmido dos versos."

Como se a ouvíssemos.



Nuno Júdice
Meditação sobre Ruínas

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terça-feira, 19 de janeiro de 2010

EDIÇÃO DE AMANHÃ DO ALTO ALENTEJO


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WALLACE STEVENS A CAMINHO DO ESCRITÓRIO

No caminho, Hartford endurece
ao mesmo tempo que se torna leve.
O outono deixa de ser outono.
Os galos não cantam.
Esse necessário mundo dos objectos
transmuda-se perante o olhar
do homem cansado, cansado mas febril
com tudo o que em si faz
o pensamento imaginante.

Em Hartford é sempre outono,
como em certas prisões. Connecticut amanhece
e surge o poema. Mrs. Halliwell vai anotá-lo
mal chegue ao escritório.


Pedro Mexia
Duplo Império

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sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

MANUEL ALEGRE DISPONÍVEL



Começo por lembrar o almoço da última campanha em Portimão, com centenas de pessoas e um grande entusiasmo, apesar do temporal desse dia. Não o faço por nostalgia do passado, mas porque essa campanha foi uma campanha pioneira, que abriu no nosso país um novo caminho à cidadania. Foi uma campanha que afirmou o poder doscidadãos e mostrou a importância da democracia participativa. Eu creio que esse é o caminho para a renovação da vida democrática.

É imperioso, no tempo que vivemos, afirmar o primado da cidadania sobre a lógica dos interesses, dos egoísmos e da indiferença.Esta é a cidade de um grande escritor português, Manuel Teixeira Gomes. Um poeta da palavra, um artista que foi Presidente da República e que, sendo Presidente, nunca deixou de ser artista. E acima de tudo um cidadão que nos deixou uma lição de ética e de sentido estético da vida.Neste ano em que se comemora o Centenário da República, voltamos a precisar desse rigor ético na vida privada e na vida pública. E também de algo que vá para além do discurso cíclico sobre as contas públicas.

As pessoas precisam de um horizonte e de uma perspectiva para além dos números e para além dos sacrifícios que lhes pedem no dia a dia. As pessoas precisam de saber porquê e para quê. E sobretudo, para além do direito ao trabalho e do direito ao pão, as pessoas precisam do direito à esperança, do direito ao sonho e do direito à beleza.

É talvez a melhor maneira de celebrar o Centenário da República e é com certeza a melhor homenagem que se pode prestar ao Presidente poeta Manuel Teixeira Gomes: voltar a dar aos portugueses uma concreta razão de esperança, voltar a dizer aos
portugueses que Portugal vale a pena e proclamar aos jovens que eles têm direito a viver e a dançar a vida, eles têm direito a outra forma de realismo: exigir o impossível. E o impossível é afinal tão simples: primeiro emprego, realização profissional, habitação, uma vida vivida sem ser em permanente precariedade.

Mas para isso, como escreveu o Professor Vitorino Magalhães Godinho – “A política de emprego tem de pôr de lado recibos verdes e contratos de termos arbitrários. O trabalho precário é um cancro para o desenvolvimento económico”. Trabalho precário, desemprego, desigualdade, insegurança, incerteza, ausência de perspectivas e de futuro.

Estes são os sinais de uma crise que atravessa o mundo e que, tal como tem sido dito, não é mais uma crise cíclica, é uma crise estrutural, uma crise que exige uma mudança profunda e de que só se sai com outro paradigma, outro projecto, outro modelo de desenvolvimento. Mais de que uma visão contabilística e tecnocrática, é preciso uma visão política, com abertura de espírito, inovação e criatividade. Mudar a economia, mudar o sentido da política, mudar a vida.

Capacidade de invenção, poder de inspiração. Esse deve ser o papel de um Presidente da República. Ser uma referência e uma fonte de inspiração. Alguém que traga consigo uma nova liderança, não pela interferência nas áreas do governo, mas pela pedagogia do gesto, da palavra e da acção. Alguém que aponte o caminho e seja capaz de nos fazer ver um pouco mais longe do que o estreito horizonte do dia a dia. Alguém que dê um sentido aos trabalhos que nos são pedidos.

Alguém que seja um patriota e um cidadão do mundo.

Alguém que se identifique com as raízes profundas da nossa história e da nossa cultura, mas seja simultaneamente um cosmopolita aberto aos problemas das outras sociedades. Alguém que em todos os momentos exerça um magistério da causa pública e do serviço desinteressado do país.

As pessoas precisam de um Presidente que não lhes fale apenas do presente, que não lhes repita apenas números e estatísticas, mas lhes aponte horizontes que lhes permitam esperar em vez de somente aguardar e muitas vezes desesperar. Como republicano, quero uma República moderna, escola pública, serviço nacional de saúde, protecção social, direitos políticos individuais articulados com os direitos sociais, culturais e ambientais.

Como socialista, acredito na possibilidade de construir uma sociedade mais justa e solidária, através de serviços públicos geridos, não pela lógica do lucro, mas pela realização do interesse geral, e através de um novo modelo económico onde se conjuguem planeamento e concorrência, iniciativa pública e iniciativa privada. Como democrata, penso que o espaço e a intervenção da cidadania são o sal da vida pública e que a democracia participativa é indispensável à renovação da democracia representativa.

Como português, digo que Portugal é muito maior do que a sua dimensão geográfica e que pela história, pela língua e pela cultura é um dos países que pode ser no mundo um actor global.

O Mundo atravessa uma crise grave. Portugal vive uma hora difícil. É sempre mais fácil desistir e baixar os braços. É sempre mais fácil dizer que nada vale a pena. Mas Portugal existe, porque houve sempre, desde o princípio e através dos séculos, um povo que acreditou que Portugal vale a pena. Um povo e dirigentes que acreditaram e agiram. E é disso que hoje precisamos. Acreditar e agir. Não sucumbir à tendência para o queixume, para a lamechice, para o fatalismo.

Dante dizia que os lugares mais quentes do Inferno estavam reservados para aqueles que em momentos críticos se mantiveram neutros. Quem me conhece sabe que não cometi nunca esse pecado. Posso ter-me enganado. E algumas vezes me enganei. Posso ter errado. E algumas vezes cometi erros. Mas nunca fui neutro. Nunca baixei os braços. Nunca fugi a nenhum combate. Nem antes, nem durante, nem depois do 25 de Abril. E também não ficarei neutro agora. Sei que para o PS e para os outros partidos parlamentares este é o tempo do Orçamento Geral do Estado. Desejo que seja possível que seja negociado sem que as negociações sejam orientadas de fora na tentativa de o orientar para certo sentido.

Compreendo que para o PS seja o momento do Orçamento. Mas, como diria o meu amigo Jorge Sampaio, há mais vida para além do Orçamento. Queira-se ou não, a próxima eleição presidencial vai condicionar, ou melhor, já está a condicionar a vida política do país. Há duas opções. Os dirigentes mais lúcidos do principal partido da oposição já perceberam que é muito difícil encontrar, a curto prazo, um líder capaz de unir o partido e o centro direita.

É grande a tentação de reagrupar o bloco conservador à volta do actual Presidente da República para, através da sua eventual reeleição, conseguir o que não se consegue por via partidária: uma maioria, um governo, um Presidente. Independentemente da pessoa do Presidente, que não ponho em causa, tal projecto, que foi sempre o sonho da direita, comporta riscos para o PS, para toda a esquerda e para o equilíbrio do regime. E tem uma lógica de deriva política de pendor presidencialista.

A outra opção é não nos conformarmos e fazer da próxima eleição presidencial uma grande mobilização, não só das esquerdas, mas de todos aqueles, de todos os quadrantes, que desejam a mudança num outro sentido e querem ver renascer a esperança num Portugal sem bloqueios, um Portugal que valha a pena, um Portugal de todos.

É esse Portugal que nos interpela. É esse o combate que chama por nós. E o que venho aqui dizer-vos é que estou disponível para esse combate. Com todos vós e com todos os portugueses que estão connosco, com todos os que a seu tempo virão a estar, para mudar e para vencer, pela República e por Portugal.

Manuel Alegre

Portimão
1ª parte



2ª parte

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PORTUGAL

O teu destino é nunca haver chegada
O teu destino é outra índia e outro mar
E a nova nau lusíada apontada
A um país que só há no verbo achar

Manuel Alegre
Chegar Aqui

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quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

UMA ESCOLA DE MERDA NA CIDADE DE PORTALEGRE



Alunos de escola de Portalegre protestam contra falta de climatização nas salas

Alunos da Escola Secundária Mouzinho da Silveira, em Portalegre, protestaram hoje à porta do estabelecimento de ensino e pelas ruas da cidade contra a falta de climatização nas salas de aulas.


Em declarações aos jornalistas, Humberto Chora, professor, mostrou-se “solidário” com os estudantes, uma vez que a escola foi recentemente remodelada, mas “não está a oferecer” as condições necessárias para os docentes e alunos. “Nós [professores] sentimos esta situação. Eu já tive alunos que sentiam muito frio e incapacidade para trabalhar porque as mãos estavam completamente geladas e houve também alunos que tiveram de abandonar as salas porque as condições não eram as ideais”, declarou.

Andreia Pereira, aluna do estabelecimento de ensino, explicou que aderiu ao protesto levado a cabo pelos colegas porque a “escola não tem condições”. “Os balneários têm água gelada e não temos fichas eléctricas para ligar os secadores de cabelo, nas salas de aulas chove e temos ar quente e frio ao mesmo tempo, entre outros problemas”, declarou. “Nós até chegamos a trazer mantas para a escola para estarmos tapados nas aulas. Por causa do frio que se faz sentir aqui, até ando um pouco doente”, revelou ainda a aluna.

Em declarações aos jornalistas, a directora da Escola Secundária Mouzinho da Silveira, Arlanda Gouveia, considerou que o protesto dos alunos “não faz muito sentido”, uma vez que o problema “começou” hoje a ser resolvido. “O protesto não faz muito sentido porque as condições começaram a ser alteradas. Desde Setembro até agora, já deveria ter sido feita alguma coisa, mas, efectivamente, temos aqui hoje o staff da parte das climatizações para resolver o problema”, sustentou.

Arlanda Gouveia revelou ainda que ponderou para hoje o encerramento daquele estabelecimento de ensino devido aos problemas relacionados com a climatização, mas recuou depois de obter a garantia, por parte do director Regional de Educação do Alentejo, de que o problema seria resolvido.

Com mais de 600 alunos, a Escola Secundária Mouzinho da Silveira foi recentemente reabilitada, num investimento que “ultrapassou largamente” os 4,5 milhões de euros, lembrou. Para o final da tarde de hoje está programada uma reunião entre vários agentes ligados à valência de climatização da escola, para que seja estabelecido um “prazo definitivo” para que o problema venha a ser ultrapassado.


LUSA

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A ESCOLA

Eis as crianças vermelhas
Na sua hedionda prisão:
Doirado enxame de abelhas!
O mestre-escola é o zangão.

Em duros bancos de pinho
Senta-se a turba sonora
Dos corpos feitos de arminho,
Das almas feitas d'aurora.

Soletram versos e prosas
Horríveis; contudo, ao lê-las
Daquelas bocas de rosas
Saem murmúrios de estrela.

Contemplam de quando em quando,
E com inveja, Senhor!
As andorinhas passando
Do azul no livre esplendor.

Oh, que existência doirada
Lá cima, no azul, na glória,
Sem cartilhas, sem tabuada,
Sem mestre e sem palmatória!

E como os dias são longos
Nestas prisões sepulcrais!
Abrem a boca os ditongos,
E as cifras tristes dão ais!

Desgraçadas toutinegras,
Que insuportáveis martírios!
João Félix co'as unhas negras,
Mostrando as vogais aos lírios!

Como querem que despontem
Os frutos na escola aldeã,
Se o nome do mestre é — Ontem
E o do discíp'lo — Amanhã!

Como é que há-de na campina
Surgir o trigal maduro,
Se é o Passado quem ensina
O b a ba ao Futuro!

Entregar a um tarimbeiro
Um coração infantil!
Fazer o calvo Janeiro
Preceptor do loiro Abril!

Barbaridade irrisória,
Estúpido despotismo!
Meter uma palmatória
Nas mãos dum anacronismo!

A palmatória, o açoite,
A estupidez decretada!
A lei incumbindo a Noite
Da educação da Alvoradal

Gravai na vossa lembrança
E meditai com horror,
Que o homem sai da criança
Como o fruto sai da flor.

Da pequenina semente,
Que a escola régia destrói,
Pode fazer-se igualmente
Ou o assassino ou o herói.

Desta escola a uma prisão
Vai um caminho agoireiro:
A escola produz o grão
De que a enxovia é o celeiro.

Deixai ver o Sol doirado
À infância, eis o que eu vos peço.
Esta escola é um atentado,
Um roubo feito ao progresso.

Vamos, arrancai a infância
Da lama deste paul;
Rasgai no muro Ignorância
Trezentas portas de azul!

O professor asinino,
Segundo entre nós ele é,
Dum anjo extrai um cretino,
Dum cretino um chimpanzé.

Empunhando as rijas férulas
Vós esmagais e partis
As crianças — essas pérolas
Na escola — esse almofariz.

Isto escolas!... que índecência
Escolas, esta farsada!
São açougues de inocência,
São talhos d'anjos, mais nada.

Guerra Junqueiro
A Musa em Férias

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terça-feira, 12 de janeiro de 2010

EDIÇÃO DE AMANHÃ DO ALTO ALENTEJO


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PALINÓDIA

Quem te chamara prima
Arruinaria em mim o conceito
De teogonias velhíssimas
Todavia viscerais

Naquele inverno
Tomaste banhos de mar
Visitaste as igrejas
(Como se temesses morrer sem conhecê-las todas)
Tiraste retratos enormes
Telefonavas telefonavas...

Hoje em verdade te digo
Que não és prima só
Senão prima de prima
Prima-dona de prima
- Primeva.

Manuel Bandeira
Libertinagem

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terça-feira, 5 de janeiro de 2010

EDIÇÃO DE AMANHÃ DO ALTO ALENTEJO


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EDIÇÃO DE HOJE DO JORNAL FONTE NOVA


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DIFÍCIL REALIDADE

Sair ao encontro das árvores
É produzir refúgio
É reduzir tudo a encontrar
Coisas

Depois vemo-nos rodeados
Por janelas
Que não alcançam
Depois as ruas
Misturam-se com as palavras
E falam em monólogo
Com as folhas

É o fumo do tabaco
Perto ao sol
As bailarinas
Junto aos olhos
O movimento lento
Do tempo

Esgota-se o sonho
Até ao limite
Num equilíbrio mascarado
Ou na ilusão

É o cansaço que se bebe
Num certo fechar
De olhos
Certa forma inquieta
De despertar

Rui Carlos Souto
Maneiras de Andar

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